Review – Outlast

Em meio a tantos lançamentos de games que tentam recuperar a essência perdida do nu e cru survival horror, um jogo independente é anunciado em outubro de 2012 com a promessa de retomar essa essência perdida. Produzido pelo estúdio Red Barrels e distribuído via Steam em 4 de setembro de 2013, você confere aqui se Outlast cumpre seu papel.

História

Você assume a identidade do até então desconhecido Miles Upshur, um jornalista freelancer que deseja disparar na carreira fazendo aquela super matéria que o deixará famoso e o irá consagrar no jornalismo, além de cobrir matérias que ninguém mais tem coragem. Miles vê essa oportunidade quando fica sabendo de uns casos um tanto estranhos, como assassinatos em massa, acontecendo num lugar chamado Mount Massive Asylum, localizado no Colorado – EUA.

Chegando de carro ao seu destino (e convenientemente à noite) Upshur identifica vários carros de tropas da SWAT parados em frente ao asilo, mas sem sinal de ninguém. Encontrando um jeito de adentrar ao local, o jornalista tem sua primeira – ótima – impressão do lugar encontrando vários corpos espalhados nos corredores. A situação piora quando ele se depara com um dos policiais da tropa de choque empalado numa sala parecida com uma biblioteca. O mesmo diz a Miles para sair dali o mais rápido possível e tomar cuidado com o perigo que ronda cada canto do asilo: os Variants. São os internos completamente insanos que andam sem rumo pelos corredores e altamente violentos, atacando e batendo até a morte qualquer coisa ou ser vivo ali presente. Miles também é atacado e perseguido por um dos internos chamado de Chris Walker, no qual será o “nemesis” do jornalista em quase toda sua jornada pela sobrevivência. Ele é extremamente grande, violento e apelida Miles de “little pig”, com a clara intenção de matá-lo.

Prosseguindo por sua jornada no asilo, Upshur aparenta ter um único “aliado” em sua busca pela sobrevivência: Padre Martin. Martin é um homem extremamente religioso e diz que Miles é um enviado de Deus para salvar as almas até então perdidas daquele local, sendo o caminho para a purificação dos pecados e descoberta da “verdade” por trás de todos aqueles incidentes. O padre também havia prometido a saída daquele inferno para Upshur assim que ele fizesse o que Martin queria. Miles toma conhecimento (a partir de Martin) que há uma entidade/fantasma/força sobrenatural presente no local, conhecido apenas como Walrider. Nisso, o jornalista assiste a uma fita de vídeo mostrando policiais da tropa de elite sendo mortos, um a um, pelo Walrider, apenas reforçando a ideia de que ele precisa fugir daquele local.

Vasculhando os papeis e documentos do local, Upshur descobre severas fraudes no sistema de segurança da Murkoff Corporation, além de experimentos “secretos” estarem ocorrendo no local. Dr. Wernicke, um dos principais doutores do hospital, estaria envolvido em um estudo chamado “Projeto Walrider”, onde se aliaria nanotecnologia com entidades sobrenaturais que, apenas aquele que sofrera graves danos psicológicos e presenciando o terror constante, poderia ser “participante” do projeto.

A história é, com certeza, envolvente e curiosa. De forma relativamente simples, conta os fatos ocorridos em Mount Massive aos poucos, com muita exploração e descoberta dos documentos no cenário do game. Resumi a história para que não se tenha detalhes muito apurados dos eventos, restringindo qualquer possibilidade de spoiler. Há mais personagens e acontecimentos que, literalmente, são de embrulhar o estômago do jogador.

Gameplay

Aqui o survival é levado a sério. Realmente a sério. O detalhe principal que fundamenta o sistema de gameplay de Outlast (e até o causador do fator “desespero” do jogo) é o fato de que Miles não pode/consegue lutar. Muito similar ao que foi feito em Silent Hill: Shattered Memories, Upshur não pode utilizar nenhum tipo de arma (brancas ou de fogo) e a suas únicas e verdadeiras “armas” são a rapidez e o pensamento rápido, além de saber manter a calma. Os Variants são capazes de te perseguir se orientando pelo som que o jogador faz, e muitas vezes irão te pegar desprevenido, causando aquele delicioso susto de pular da cadeira. Toda vez que Miles está sendo perseguido, é preciso despistar o Variant, correndo em círculos e muitas vezes fazendo um backtracking bem desagradável, voltando a lugares que você já tinha passado há vários minutos atrás. Levando isso em consideração, a melhor chance de escapar mais facilmente é quando o alucinado não te bateu ainda, porque assim que Miles for atingido, sua respiração ficará mais ofegante e nervosa que o normal, fazendo com que eles te ouçam, mesmo que escondido. Portanto é preciso correr bastante e se esconder num lugar relativamente longe para que o Variant não te ache de novo e dê início a mais um ciclo exaustivo de fuga, muitas vezes desnecessário. O sistema de saúde do jogo trabalha com recuperação automática, reforçando ainda mais o fator de você saber se esconder bem para recuperar a vida e acalmar a respiração de Miles. Cada hit de um inimigo tira uma quantidade razoável, sendo necessários várias porradas para o jogador morrer (dependendo do Variant, claro. Walker consegue matar Miles em poucos hits).

Além de Padre Martin, Upshur possui outro aliado: sua câmera. Esse dispositivo que literalmente se tornou um salva-vidas, é capaz – obviamente – de gravar todos os incidentes e cenas grotescas do asilo, além de possuir visão noturna que deixa as coisas ligeiramente mais arrepiantes. A visão noturna faz decair a qualidade da imagem, mesmo que sua capacidade de clarear o ambiente seja boa. Para a câmera funcionar, ela precisa de baterias que você acha pelo cenário (escondidas ou não) e que variam o número de acordo com a dificuldade que o jogador esteja. Há um indicador no canto da tela quando o modo câmera está acionado que indica o restante da bateria e quantas reservas você tem, além de mostrar o tempo de gravação (o que pode servir para medir quanto tempo de gameplay você já tem). As baterias são consumidas apenas no modo de visão noturna, e quando elas acabam, o night vision fica como se fosse a visão normal, mas em uma cor negativa. A transição e qualidade da imagem do modo normal para o câmera é impressionante, dando aquela sensação de realmente estar gravando algo devido à mudança de “película” da imagem estando no modo câmera. Os efeitos em visão noturna também são incríveis, dando aquele efeito súbito de desespero.

Miles, sendo um jornalista, também age como um. Se deparando com situações grotescamente nojentas e surreais, cada vez que você grava uma dessas, ele faz uma anotação em seu caderno. Um ícone de notificação aparece no canto inferior esquerdo da tela e indica que Miles fez uma anotação relativa à cena que acabou de acontecer e/ou ao que está acontecendo no momento de modo geral. Essas anotações contém informações importantes para a história, além de te dar um parecer de como o personagem está se sentindo naquele momento. Além das anotações, é necessário achar diversos documentos por todo o asilo, com notas dos médicos sobre os experimentos que estão acontecendo ou simplesmente sobre os pacientes e seu comportamento. Isso é importante caso, claro, o jogador esteja interessado em um entendimento maior sobre o enredo do game.

Falando sobre os movimentos básicos do personagem, Upshur é capaz de andar, correr, pular, pular sobre obstáculos, se agachar, se esconder em armários e de baixo de camas, correr olhando para trás e dar aquela “espiadinha” quando você encosta em alguma porta e quer ver o que tem no corredor sem se expor completamente, por exemplo. Você também é capaz de pular para alcançar lugares mais altos, pressionar botões, coletar itens temporários etc; o jogo não possui sistema de inventário. Falando em fuga, toda vez que você se esconde em um armário, sua visão se limita àquelas frestas presentes na porta do armário ou apenas olhando para frente e um pouco para o lado quando é de baixo das camas. Sendo perseguido, Miles pode fechar portas, atrasando o progresso do Variant atrás de você e dando mais tempo para se esconder; pulando obstáculos também atrasa o progresso destes. Infelizmente camas e armários são os únicos métodos de esconderijo, então também saiba utilizar as sombras que algumas vezes podem ser úteis.

É um gameplay simples, mas aterrorizante. Só o fato de você não puder lutar, deixa as situações duplamente mais tensas que vai exigir paciência, por conta de algumas fugas bem cansativas e aos sustos que com certeza vai tomar. Há um certo detalhe relacionado a inteligência artificial do game que irei falar mais adiante.

Quesitos Técnicos

Gameplay Técnico e Inteligência Artifical

A jogabilidade técnica de Outlast não é segredo. Dito anteriormente, Miles pode realizar ações básicas com fluidez, mas que certas horas podem se confundir. Por exemplo, você pode abrir uma porta de uma vez ou abri-la aos poucos. Na fuga de um Variant, obviamente a porta que deveria abrir de uma vez, Miles fica empacado e a abre lentamente, dando tempo do cara chegar e te arrebentar na porrada. A física do game é realista e representa bem os movimentos e a pouca interação com o cenário, sendo objetos pré-determinados que podem ser acionados/mexidos, assim como só algumas portas podem ser abertas.

A IA dos inimigos é uma coisa bem divida. Eles não trabalham com estratégias para tentar te encurralar (quando raramente aparece mais de um inimigo ao mesmo tempo) e simplesmente são ligados no modo “search and destroy”. Há um momento que em três Variants irão te perseguir e, em meio a tantos caminhos para eles te encurralarem (à lá fantasmas do Pac Man), os burrões simplesmente te seguem em fila indiana, um atrás do outro, dando a possibilidade do jogador “roubar” algumas horas. Digamos que você tem que fazer alguma coisa para abrir uma porta e há dois inimigos te perseguindo. Você pode simplesmente ficar dando voltas até abrir a porta por completo do que pensar num plano de fuga para eles te esquecerem e você cumprir o objetivo. Tirando isso, não constatei a presença de bugs relativos a IA, como ela desligar e o inimigo ficar imóvel. De modo geral é uma coisa simples, mas funcional.

Gráficos

Talvez um dos pontos mais fortes do game além dos sustos imprevisíveis e clima de tensão constante. Vale lembrar que Outlast é um jogo independente e mesmo assim trouxe gráficos incríveis e detalhados. Os inimigos são horríveis (no bom sentido) e transmitem aquela sensação de horror e sofrimento por trás daquele ódio irracional resultante da loucura; os cenários são muito bem detalhados e obscuros, com todas as marcas e sentimentos que um sanatório devia trazer ao jogador ali presente. A violência gráfica é surrealmente alta, com mutilações, decapitações, fraturas expostas, corpos ensanguentados, indícios de canibalismo e todo o tipo de escória que você possa imaginar, e tudo feito nos mínimos detalhes. Cada víscera e dobra intestinal é visível e identificável, o sangue detalhado em cada cadáver parece ter sido desenhado à mão. São meros detalhes que, ao conjunto, fazem toda a diferença e você percebe que foi dada a devida atenção. Quando Miles se apoia sobre uma parede e coloca as mãos a mostra, é possível ver os ossos de sua mão, assim como as veias ressaltadas e micro rachaduras de pele. Jogando numa configuração máxima (no caso do PC, além da versão do PS4 ser muito bonita também) os detalhes são dobrados. O jogo foi produzido na Unreal Engine e ousaria dizer que utiliza muito do potencial desse motor gráfico.

Áudio

O game não conta com músicas marcantes, já que para se predominar um clima de tensão, é necessário o mínimo de som possível (ou uma música que se misture subitamente ao cenário) para que cada detalhe audível do cenário possa deixar o jogador mais alerta. Portanto, de música mesmo, tempos apenas aquelas de perseguição para apimentar ainda mais as coisas. E no caso, são boas e fazem seu dever.

Na perspectiva “áudio geral”, o game também consegue se superar. Apesar de Miles ser um protagonista mudo, a dublagem dos personagens são muito boas, principalmente as dos Variants e de Walker. São vozes carregadas e pesadas, com rancor e uma pitada de sarcasmo. Pode até ser exagero, mas é possível perceber a agonia no tom de voz dos internos, daquele sentimento de raiva constante. A dublagem com certeza foi feita com maestria. Já os diversos efeitos sonoros também são notavelmente destacáveis, onde cada ambiente se encarrega de passar o que deveria devido ao seu som ambiente. Os gritos de dor e sofrimento de Miles em diversas horas do game também são notáveis e agonizantes.

Conclusão

A experiência de Outlast, para muitas pessoas (incluindo as de estômago fraco e curiosamente medrosas) pode ser algo pesado. O jogo possui uma violência gráfica altíssima, clima tensionado a todo momento e sustos imprevisíveis. Se você já for acostumado com esse tipo de game e até gosta (masoquista!), Outlast é um imprescindível jogo do gênero e que vai ficar marcado pelo seu Survival Horror atenuado por muito tempo, quem sabe até servindo de base para futuros games de terror.

Agora se você for do tipo de pessoa mais pra curiosa do que amante desse gênero, reveja suas considerações sobre comprar esse game ou não. Claro, a experiência de cada um é completamente diferente e a interferência de fatores externos (jogar de dia, jogar com os amigos etc) é variada e pode afetar sua imersão nesse mundo grotesco e infernal que Miles Upshur passou. Por isso, considere todos esses pontos. A Red Barrels fez um ótimo trabalho em trazer esse título de peso para complementar o catálogo de games de horror.

Pontos Positivos

  • Sustos imprevisíveis
  • Gráficos incrivelmente detalhados
  • Enredo interessante

Pontos Negativos

  • Relativamente curto
  • AI dos inimigos muito simples para o estilo de jogo
  • Fator replay escasso

[infobox title=’Ficha Técnica’]Outlast
Plataformas: PlayStation 4, PC
Desenvolvimento: Red Barrels
Distribuição: Red Barrels
Data de Lançamento: 04/10/2013 (PC), 04/02/2014 (PS4)[/infobox]