Sendo sincero, quantas pessoas esperavam ansiosamente um novo game baseado em Wolfenstein? Uma sequência que deixava todo mundo morrendo de ansiedade, contando os dias para chegar? Se tiver, eram pouquíssimas pessoas. Os últimos jogos da franquia foram bem medianos, para não dizer fracos. E a saga estava pra lá de esquecida.
Sendo assim, a Machine Games (estúdio responsável por The New Order) tinha um trabalho dobrado. Fazer um jogo sólido, interessante e que, ao mesmo tempo, não seja a mesma fórmula batida genérica de qualquer outro FPS do mercado. E claro, que honrasse o nome “Wolfenstein” em seu título. Quando The New Order foi anunciado, eu sinceramente não esperava nada demais. Até entrar novamente na pele de B.J Blazkowicz e sentir aquela empolgação que há tempos não sentia jogando um FPS.
Foi uma imensa satisfação, uma grande surpresa e um título que revigorou uma franquia que estava apagada há tempos. Confira aqui, em minhas concepções, o quão esse Nazi Killing Simulator 2014 trouxe um sentimento inovador e nostálgico ao mesmo tempo.
Enredo
“Você me chama de Deathshead, e eu não gosto disso. Eu sou um homem feliz, você não vê?” – Gen. Wilhelm ‘Deathshead’ Strasse.
Na época do desenvolvimento de Doom, John Carmack (criador de Wolfenstein, Doom e Quake) disse que “história em um vídeo-game é como história em um filme pornô. Está lá, mas não é tão importante”. E devo agradecer a Machine Games e Bethesda por não darem continuidade a esse tipo de pensamento, mesmo que seja do próprio Carmack. Os tempos são outros, os jogos evoluíram de uma maneira que apenas o mata-mata não sustenta toda a base de criação de um game, e vai muito além disso. Wolfenstein: The New Order é um tapa na cara de seu próprio criador por dizer tais palavras.
Começamos em pleno combate áreo, no ápice da guerra, em 1946. Sim, a Segunda Grande Guerra não acabou em 1945 em The New Order e há uma explicação para tal. As forças aliadas estavam sendo massacradas pelo Terceiro Reich, e cabia a uma pequena unidade de Rangers do exército dos Estados Unidos de pararem esse avanço terrível do exército Nazista. No comando do esquadrão estava nosso protagonista, guerreiro, chutador de bundas, Capt. William Joseph Blazkowicz, mais conhecido como B.J Blazkowicz. Ele que é protagonista fixo da franquia Wolfenstein, agora tem o apoio de seus fiéis companheiros de esquadrão, Fergus Reid e o novato Probst Wyatt III.
B.J havia uma missão: se infiltrar no forte impenetrável do General Nazista Wilhelm ‘Deathshead’ Strasse e o matá-lo. Com a morte de Deathshead, o exército nazista se desestabilizaria e as forças aliadas teriam chance novamente para virar e ganhar a guerra.
“Ok, ok, mas como diabos os nazistas estavam ganhando a guerra?” E é nesse ponto que entra a sacada do enredo. Deathshead conta com inúmeros inimigos fortemente armados, cães robôs gigantes, máquinas de destruição em massa em pontos estratégicos de todo o planeta. Os nazis dispunham de uma tecnologia extremamente avançada para época e assim puderam fazer novos armamentos que os Aliados certamente não estavam esperando. “E da onde veio essa tecnologia?!” Aí, meu amigo, você vai ter que jogar.
Só que, o que eu falei até agora, é apenas o prólogo do game. Para ter jogo, uma merda bem grande tinha que acontecer. E qual é a desgraça, você já deve ter noção: os nazistas venceram a guerra. O esquadrão de B.J falha miseravelmente e é preso por Deathshead, onde ele obriga B.J a fazer uma das decisões mais difíceis de sua vida. E essa decisão acarretará mudanças no enredo e no gameplay, fazendo o jogo ter um fator replay bem interessante (detalhe que falarei mais a frente). Entretanto, a pré-potência de Deathshead fala mais alto e acha que B.J irá morrer ali apenas porque ficou preso. Como nosso grande companheiro Blazko é muito mais que um soldado comum, ele consegue fugir, mas paga um preço bem alto. Deathshead o deixou preso numa câmara de experimentos e liberou um gás inflamável que irá explodir aquela área a qualquer segundo, e no último momento antes da explosão, B.J pula a janela num ato de desespero e estilhaços da explosão acertam sua cabeça, o deixando em coma por 14 anos.
Neste ponto é onde o tempo avança e o exército vermelho de Deathshead ganha a guerra, de 1946 até 1960, ano que B.J acorda.
Deixado à deriva, um barco polonês o encontra quase morto e levam-no para o hospital, onde os médicos sem sucesso algum tentam retirar os estilhaços do cérebro de Blazko, dando um prognóstico bem pessimista que o deixaria sendo um vegetal para sempre. Porém, não foi bem assim. Após o hospital, Blazko vai para uma instituição de saúde mental, onde uma das enfermeiras chamada Anya cuida com todo carinho e amor de B.J, fazendo-o, lentamente, melhorar de seu estado vegetativo. E não havia momento melhor: o chuta bundas acorda bem em meio a um ataque nazista ao asilo, onde erroneamente um dos soldados assassina um dos pacientes e se tem o início de um massacre, incluindo os pais de Anya.
[quote align=’left’]Os diálogos são muitíssimo bem detalhados e há vida em todos os personagens envolvidos, principalmente no que tange ao relacionamento de Blazkowicz e Anya.[/quote]
Tomamos novamente o controle de Blazkowicz, no qual magicamente já levanta matando nazista, andando e fazendo movimentos extraordinários para quem acordou de um coma de 14 anos sem fazer nenhuma sessão de fisioterapia. O máximo que ele sente é uma dorzinha de cabeça ali e cá, nada demais. Matando todos os nazistas da área, B.J salva Anya e ambos vão para a casa de outros parentes da moça.
B.J agora precisa se armar novamente, encontrar com seus antigos companheiros e bolar um contra-ataque urgente a uma guerra que já está perdida.
Tirando o fato extremamente exagerado de Blazko acordar e já sair matando gente, o enredo de The New Order é extremamente sólido, bem contato e com personagens MUITO carismáticos. Todos têm suas motivações e objetivos, formando o esquadrão da resistência contra o exército nazista. Os diálogos são muitíssimo bem detalhados e há vida em todos os personagens envolvidos, principalmente no que tange ao relacionamento de Blazkowicz e Anya. Você se importa com os personagens, quer saber o que irá acontecer com cada um deles. E principalmente filosofar junto com B.J em suas inúmeras sequências cinematográficas e incrivelmente dramáticas.
Gameplay
Sendo um dos pontos mais fortes do jogo, The New Order mesmo não trazendo grandes inovações, consegue te prender do início ao fim com seu sistema básico (e ao mesmo tempo completo) de gameplay. A coisa é simples e bem feita: B.J pode andar, correr, agachar, andar agachado, correr e deslizar, executar ataques corporais com facas, arremessar facas, realizar stealth takedowns (execuções silenciosas), atirar com pistolas, metralhadoras, shotguns, miniguns, arremessar granadas, jogar granadas de volta aos inimigos, enfim… Uma variada gama de movimentos, e um arsenal melhor ainda.
O ponto destaque se encarrega de poder carregar duas armas ao mesmo tempo. Algo como em Max Payne, mas limitando-se a duas armas do mesmo tipo (duas pistolas, dois rifles etc e não uma pistola e um rifle). É possível carregar duas shotguns ao mesmo tempo. Sim, duas .12 ao mesmo tempo, e atirar com elas simultaneamente. É uma satisfação que há tempos eu não sentia jogando um FPS.
Cada arma tem dois tipos de tiro, com base em pequenos upgrades que você acha ou que fazem parte da história. Por exemplo, o rifle de assalto nazista é passível de upgrade com um lançador de mísseis. Apertando setinha para direita ou esquerda, troca-se o tipo de tiro/munição. Ao empunhar duas armas, é possível atirar com cada tipo de munição ao mesmo tempo.
Ainda fazendo uma ponderação sobre o tipo de armamento, como eu havia explicado na parte da História, o game se passa em duas épocas diferentes. Uma na Segunda Guerra, no prólogo do game, e a outra 14 anos depois. Com isso, as armas sofreram modificações pelos nazistas, no qual ficaram mais pesadas e letais. Modificações no visual também foram feitas, acrescentando tinturas em preto e vermelho, assim como alguns aspectos físicos, deixando-as singelamente mais bonitas. Com isso, algumas armas passaram a utilizar uma espécie de energia radioativa como munição (uma espécie de laser). Sendo assim, o jogo faz um ótimo uso dos cenários destrutivos, onde é preciso cortar cercas e alambrados de metal para progredir na história. Juntamente, há uma destruição de cenário considerável, mas em pontos específicos. Não é todo por completo destrutivo.
Há uma arma que B.J irá levar consigo a maior parte do jogo, chamada de Lazerkraftwerk (ou LKW). É uma sra. arma gigantesca que dispara rajadas radioativas em formas de laser, onde é possível encontrar vários upgrades para aumentar sua potência. Como disse acima, é possível usá-la para cortar vários obstáculos no cenário para progredir na história.
[quote align=’left’]Gameplay frenético, exagerado e ao mesmo tempo suave e completo te esperam nessa reinvenção de Wolfenstein.[/quote]
A furtividade também conta com grande parte em The New Order. Se você pensou que poderá bancar o Rambo no jogo inteiro, com duas metralhadoras em punho, matando nazistas em cada esquina, bem, você pode. Sério, você pode. Mas tenha em mente: toda área nova te dá a liberdade de aprochegar das duas formas: Rambo ou Garrett. Combate excessivo ou furtividade.
Nessas áreas, haverá um indicador no canto superior direito na tela que dirá “Sinal detectado” e há quantos metros aquele sinal está de você. Localizando a emissão desse sinal, você localiza os capitões daquelas tropas ali presentes. Matando o capitão, você desativa a possibilidade de reforços. Ou seja, haverão bem menos inimigos do que teria se você entrasse quebrando a porta e metendo bala na cabeça de todo mundo desenfreadamente. E quando o alarme é tocado, se haviam 10 inimigos, vão chegar mais 10. E todos bem espertinhos (fator que mencionarei na inteligência artificial, nos aspectos técnicos).
Wolfenstein: The New Order tem fatores que relembram FPS clássicos, mas mantém uma postura de jogo atual. Coletar vida, armadura e carregar trocentas armas ao mesmo tempo dão início àquele sentimento saudosista de Quake e Doom, mas The New Order sabe ter uma personalidade bem definida. Compará-lo com jogos oldschool é praticamente um insulto, visto os vários aspectos técnicos avançados e completamente providos de uma qualidade muito além dos jogos clássicos. Sim, os clássicos são bons, mas convenhamos que não há comparação em quesitos técnicos com jogos portadores de engines muito mais poderosas, né?
Quesitos Técnicos
Áudio e Gráficos
Quando The New Order estava para ser lançado, uma das coisas que mais me deixou preso à suas informações, vídeos e trailers, foram as músicas. Muitíssimo bem escolhidas (e todas em alemão), o marketing do game acertou em cheio ao trazer um aspecto vintage com músicas caricaturadas a esse estilo. Infelizmente, no game as músicas que eu gostaria que estivessem presentes, não estavam. Porém, pelo menos para minha felicidade em contra partida, as outras que compunham a trilha sonora eram no mesmo nível de excelência no que condizia com o feeling do jogo. Um ritmo e batida mais pesado e acelerado nos momentos mais tensos e de ação, uma coisa mais maneirada em cutscenes e outros momentos mais calmos do jogo, e assim iria. Tudo seguindo um conforme com músicas igualmente boas e divertidas que acompanhavam os momentos do game (menos a dos créditos, porque meu amigo… Muitos feels).
A dublagem presente é um dos melhores aspectos técnicos do jogo também. Todas as vozes combinam perfeitamente em seus personagens, com dubladores de excelente competência que executam um belíssimo trabalho. Soldados e habitantes alemães falam, de fato, alemão. Todos, sem exceção. Coisa que muito jogo insiste naquela tosqueira de insistir em falar em inglês mesmo em países que não são de língua inglesa. Mesmo em algumas horas quando a palavra é dirigida para Blazko, os personagens interagem em alemão com você. E não só alemão, os parentes de Anya falam polonês na maior parte do tempo, assim como ela quando encontra B.J pela primeira vez.
Em quesitos gráficos, o game trabalha com a id Tech 5, a engine mais atual da id Software. É uma poderosa engine que produz ótimos resultados com visuais belíssimos e uma optimização muito boa. O game roda a 1080p e 60 FPS nos consoles da nova geração, praticamente sem quedas de quadros. Bugs podem ocorrer, como coisas sumirem do nada ou uma renderização mais atrasada, mas nada escandaloso.
Os cenários são belíssimos, bem trabalhados, e como mencionado anteriormente, com um grau de destruição bem satisfatório. A direção de arte do jogo é de excelência e traz um traço diferente, com uma aparência que pode tentar remeter a algo cartunizado, mas que fica só na impressão mesmo.
E se tem algo que eu possa considerar a todos meus amigos que gostam de cinema (assim como eu), diria que esse jogo seria dirigido por Quentin Tarantino. A violência gráfica, mutilação e sangue sendo jorrado por todos os lados é um ponto que remonta muito bem as obras de Tarantino, fora a temática nazista e singelamente avacalhada que lembra a de Bastardos Inglórios, mesmo o foco sendo diferente. Espere pra ver muitos membros voando e violência desenfreada por muitas horas em The New Order.
Inteligência Artificial
Outro ponto bem interessante a ser ressalto é o comportamento dos inimigos em batalha. Muitos podem pensar que eles simplesmente são burros e ligados no modo “matança”, mas não é bem assim. Independendo da dificuldade que você esteja (variando apenas alguns pontos por motivos óbvios – eles não são tão espertos no very easy, por exemplo) a A.I sempre trabalha de modo parecido. Vão procurar cover em 90% das vezes, tentar flanquear de vários pontos diferentes e até tentar te emboscar. É uma inteligência artificial bem feita na qual não encontrei problemas no que remete ao seu funcionamento e “desligamentos” repentinos. A mudança de dificuldade pesa muito mais no dano que você sofre e no causado, na relação de perca de armadura etc.
[quote]Todos tem comportamentos variados e interligados à suas devidas funções.[/quote]
Alguns inimigos são mais ágeis e pensam mais que outros, como era de se esperar. Não espere a mesma reação de um soldado comum no robô gigante ou em inimigos mais brutos (como alguns que lançam mísseis, por exemplo). Todos tem comportamentos variados e interligados a suas devidas funções.
Conclusão
Temos aqui um FPS que conseguiu cumprir seu dever de: carregar um nome de peso nas histórias dos FPS e se destacar nesse meio de quilos e quilos de jogos em primeira pessoa. Wolfenstein: The New Order é um game sólido, divertido e bem feito. Sendo exclusivamente single-player, traz mais de 15 horas de gameplay em sua primeira jogada, com direito a uma segunda tranquilamente (duas timelines), coletáveis e novos modos de jogo após o zeramento.
[quote align=’left’]Wolfenstein: The New Order é um game sólido, divertido e bem feito. [/quote]
Considero The New Order um gostinho do que iremos ver no novo reboot de Doom, que será anunciado no ano que vem. Até lá, temos um senhor master piece advindo dessa empresa de peso que é a id Software, mesmo após a saída de um de seus fundadores e criador da franquia, John Carmack. Se você gosta da franquia, gosta de FPS e quer algo que dure e seja divertido, além de trazer uma história boa (mesmo sendo nonsense para alguns), esse novo capítulo de Wolfenstein certamente irá te agradar. Mas lembre-se: para um total aproveitamento, recomenda-se jogar nas versões da nova geração ou PC, por justamente trazer quesitos gráficos mais avançados.
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- Gameplay extremamente divertido
- Enredo e personagens interessantes
- Longo com segunda jogada garantida
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- Bem exagerado em alguns pontos
- Aproveitamento melhor na nova geração
- Poderia ser um pouco mais desafiador
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