A velha discussão sobre games serem ou não uma forma de arte sempre vem à tona, na minha mente, quando jogo algo parecido com The First Tree. É difícil até separar os sentimentos evocados da minha parte analítica, a parte que deveria estar neste texto, imparcial e tecnicamente neutra.
De tempos em tempos surgem títulos memoráveis. The Legend of Zelda: Ocarina of Time, Metal Gear Solid, Shadow of The Colossus… games que marcaram época e que são inquestionavelmente obras implacáveis.
Evidentemente The First Tree não entra no hall dos geniais citados acima. Na verdade, ele se descola totalmente. Mas, sem a pretenção de te colocar em um universo com controles apurados e desafios profundos, o indie da raposinha se propõe a apenas te contar uma história. De uma forma bastante sólida e sentimental.
Visual e emocionalmente impressionante
A primeira vez que tive contato com The First Tree foi através de um trailer para o Nintendo Switch. De cara, fiquei impressionado com as cores e o bom gosto visto em cada pedaço daquele estranho mundo, onde você é uma raposa em busca da Primeira Árvore.
De cara senti uma certa semelhança com Journey – inspiração evidente nesta obra de David Wehle. Todo o game se passa dentro do sonho de Joseph, um homem que está passando por um momento nostálgico de sua vida, em que lembranças tomam conta de sua mente, através de curiosos pontos de luz. O jogo te coloca na pele da misteriosa raposa, protagonista do sonho de Joseph – que narra a história. Conforme você avança pela floresta, cruzando as árvores e a floresta das memórias, a história vai sendo narrada, através de uma conversa entre o Joseph e sua esposa – como se fosse um papo na madrugada, daqueles que acontecem quando você acorda de um sonho vívido demais para conseguir voltar a pregar os olhos.
Em meio a cores e torres de luz, que te guiam em direção as memórias, toda a vida de Joseph é relembrada por ele – da infância com seu pai, até a fase adulta. A raposa acaba sendo apenas um guia, uma forma de te colocar dentro daquele emaranhado de sentimentos que as lembranças trazem a tona.
Toda a história é muito bem contada e a maneira como Wehle escolheu de passar tudo o que Joseph viveu para o jogador é, definitivamente, encantadora.
Um probleminha aqui e outro ali
The First Tree foi lançado no final de novembro, do ano passado. E o que me afastou de pegá-lo no lançamento foram os trailers de gameplay.
Nos vídeos podíamos ver uma jogabilidade dura, bastante ultrapassada. Por mais que se trate de um jogo desenvolvido por um homem só – temos dezenas de casos semelhantes em que isso não acontece. Mas, vai por mim, se você estiver disposto a sentir o game, certamente esses “problemas técnicos” não serão um obstáculo para que você aprecie o que ele tem a oferecer.
Em poucos momentos me senti prejudicado pelas mecânicas, somente em um trecho, quase no fim da trama, me senti perdido. Mas, sendo bem honesto, a culpa foi mais minha do que do jogo em si. Eu que tentei escalar uma montanha que, evidentemente, não era para ser escalada. A tal da Síndrome do Cavalo de Skyrim, tá ligado?
No fim das contas, a narrativa se sobrepõe as (poucas) falhas na mecânica. Se você, é claro, estiver interessado em entrar no que o game quer te proporcionar.
No fim das contas, uma experiência belíssima
Apesar de não abordar um tema totalmente novo, The First Tree entrega tudo de uma forma enigmática e muito sútil. A sensibilidade do roteiro, os diálogos extremamente realistas e todo aquele universo curioso, te colocam dentro da engrenagem, te obrigando a fazer tudo girar apenas para descobrir do que se trata a jornada de Joseph e da raposa misteriosa.
Some a sensibilidade da história com um cenário belíssimo, capaz de te surpreender do início ao fim, mais a trilha sonora impecável e você terá um resultado extremamente sensível e marcante.
Se você, assim como eu, gosta de se desligar as vezes, abaixar as armas do seu FPS favorito, jogar a bola para fora no seu simulador de futebol e descansar dos sustos, que o seu amado survivor horror vem te dando, dê uma chance a The First Tree. Provavelmente você não irá se arrepender.