Após a E3 deste ano, algo ficou claro: estamos presenciando o fim dos consoles da forma que os conhecemos. O Xbox Scorpio foi anunciado, ostentando especificações mais refinadas e assim redefinindo a ideia das gerações de videogame — ou pondo um fim a este conceito. Digo isso pois o novo hardware não é uma nova plataforma, mas sim um Xbox One mais potente e ainda pertencente à oitava geração.
Phil Spencer afirmou que todos os jogos serão compatíveis entre ambas as plataformas; “ninguém vai ficar de fora”. No entanto, a história já nos ensinou que quando há uma tecnologia mais robusta, as desenvolvedoras sempre vão buscar tirar o máximo dela. Arrisco dizer que com o Scorpio não será diferente, o que nos leva a crer que não é tão absurdo imaginar que o Xbox One original deverá sofrer ao executar alguns futuros títulos — assim como vimos com muitos jogos cross-gen no PS3 e Xbox 360 entre 2013 e 2015.
Enfim. Após tantos anos seguindo com um hardware fixo, o que fez a indústria investir nos tais consoles “4K”?
A sede pela evolução
O PlayStation 4 e o Xbox One chegaram ao mercado no final de 2013. O alarde envolvendo “o feel da experiência next-gen” não tinha precedentes. Todos ansiavam pelos novos limites a serem atingidos e as possibilidades que eles ofereciam.
Bem, os gigantes acordaram, mas foram ultrapassados pelos PCs rapidamente. Não tardou até que títulos como Assassin’s Creed: Unity provassem seus limites. Dessa vez não há um hardware supercomplexo a ser desvendado e ter seu uso aperfeiçoado com o tempo, caso que aconteceu com o PlayStation 3, que usava o processador Cell, frequentemente criticado pelas dificuldades de desenvolvimento.
“Tenho certeza de que o Cell atrasou a indústria significativamente. Era complexo no que não deveria ser…”
O que nos foi mostrado de melhor em questão gráfica é o que tem pra hoje e pro resto da geração — o PlayStation e Xbox ditam esse padrão na maior parte das vezes, não é nenhuma novidade.
Ainda que isso não seja o fim do mundo, é fácil encontrar comentários de pessoas dizendo que essa geração “já deu o que tinha que dar”; que apenas supostos PlayStation 5 e Xbox Two trariam jogos inovadores e sólidos em desempenho novamente.
Spoiler alert: temo que as coisas não funcionem dessa forma. Exigir novos patamares gráficos também é exigir projetos maiores, que requerem equipes gigantescas e orçamentos estratosféricos — afinal, é difícil atender às minuciosas exigências do público. Mas investir muito em um jogo quer dizer que ele precisa ser um sucesso de vendas, e é daí que surgem os DLCs desenfreados, títulos que não inovam (presumidamente por medo de errar a mão e não agradar) ou, até pior, trailers e gameplays que não condizem com o produto final. Sendo bem sincero, esse é um problema cujo agravamento é inevitável e, por isso, evito pensar em como a indústria vai tentar remediá-lo. Enfim, papo para outro artigo.
Todo esse alarde do público nos rendeu novos consoles: o recém-anunciado Xbox Scorpio e o PlayStation 4 Neo, o segredo mais mal escondido da Sony. Eles podem ajudar a mitigar um pouco do problema mencionado acima… temporariamente. Ao limitar a geração às mesmas condições dos irmãos mais velhos, veremos uma melhora em desempenho, mas os custos de produção deverão se manter. Isso, ao menos, provavelmente fará com que essa geração perdure por mais tempo. Mas ainda é uma solução tapa-buraco que não precisava existir se os jogadores de console não estivessem exigindo qualidade de PC em seus videogames — o que nos leva ao próximo ponto.
Consoles não são PCs — e jamais deveriam tentar ser
“Eu sei, você se decepcionou porque eu não consegui ser como você…”
“Não. Eu me decepcionei porque você tentou ser como eu.”
— Inception (2010)
Não é difícil entender a origem das reclamações quanto aos gráficos. Há tempos, a “guerra” do PC contra o console acontece, mas só ganhou tração alguns anos atrás. Tudo parece atrasado em relação aos computadores equipados com o hardware mais atual, evidenciando a incapacidade dos jogos de console desempenharem a resolução, framerate ou qualquer outro aspecto gráfico da forma considerada ideal pelos mais exigentes. Além do mais, alimentar essa briga parece estar no topo de prioridades da mídia de jogos, o que alastrou exponencialmente a discussão ao longo dos anos.
Mas vamos lá: títulos de gerações passadas sofriam com quedas de framerate? Positivo. Resolução abaixo do padrão? Yep. Tínhamos um referencial de uma plataforma mais forte para comparar? É, nem sempre. O Steam não era tão difundido, e o PC tinha a fama de receber versões porcamente desenvolvidas dos jogos (Saints Row II, GTA IV ou o primeiro lançamento de Resident Evil 4 são ótimas evidências disso).
Com o crescimento do software da Valve, muitos títulos AAA, antes limitados aos videogames, viram a luz do dia no PC, tornando essa plataforma mais relevante do que nunca.
E com isso, as pessoas criaram um pequeno monstro: a fixação pelas comparações (que já aconteciam antes, diga-se de passagem). Qualidade de texturas, métodos de antialiasing e outros bichos frequentemente denotavam a superioridade do PC nessa discussão nada mais que assimétrica — pois no final das contas, PCs e consoles funcionam de formas diferentes, e ainda que o cenário atual os ilustre como concorrentes, eles nunca foram. Portanto, você não é razoável quando exige que componentes técnicos de três anos atrás (ou até mais) acompanhem os PCs atuais.
A história é velha: os consoles têm um hardware fixo e os PCs não, permitindo que sejam aprimorados com a substituição de componentes mais atuais, como placa de vídeo, processador, SSD e afins. Com essa evolução, seu videogame, estático, fica para trás. Então quem não nos garante que o incrível Xbox Scorpio não esteja fadado ao mesmo destino? E aí vamos pedir por um Scorpio 2? Videogames com peças substituíveis? Não demora para percebermos que tanto o Scorpio quanto o Neo são soluções artificiais para problemas inexistentes. A fama de “consoles-PC” uma hora cairá por terra. Se você espera que todos os seus jogos rodem sem quaisquer comprometimentos para toda a eternidade, bem… o PC está ali justamente para essa necessidade.
…
É verdade, basta acompanhar a evolução da tecnologia para concluir que esta geração de consoles está sim obsoleta. Mas sob essa perspectiva, qual das anteriores também não estava?