Em tempos que games com muitas horas de gameplay são tratados como pré-requisito para o sucesso, recomendar um título como A Short Hike chega a ser uma ousadia. É comum ser questionado se uma indicação vale a pena, sempre com o questionamento atrelado à durabilidade do título.
“Ah, mas eu vou pagar 40 reais nesse jogo que não dura um mês de gameplay e não tem 450 sidequests?”. É, aqui não vai funcionar desse jeito.
A frase clichê “menos é mais” nunca se sentiu tão representada quanto no game independente do designer canadense Adamgryu. Lançado inicialmente para PC em 2019, A Short Hike aterrizou de surpresa em 2020 no Nintendo Switch, como se fosse feito para estar ali desde sempre. Com gráficos abusando do pixelart, que saltam aos olhos por sua beleza única, o game parece uma pintura retrô em movimento, emulando sensações de títulos marcantes do Nintendo DS e entregando um visual bem característico.
Explore e se deixe levar
A Short Hike é um game de aventura que te coloca na pele de Claire, uma passarinha cheia de personalidade, que é obrigada a visitar sua tia em uma ilha afastada da cidade chamada Hawk Peak.
O jogo começa com a protagonista descobrindo um problema: na cidade, o seu celular não tem sinal de operadora. Logo em seguida o objetivo principal da jornada é revelado. Claire está aguardando um telefonema importante e precisará encontrar uma forma de recuperar a conexão. Orientados pela tia da personagem, logo descobrimos que precisamos chegar ao ponto mais alto da ilha, pois lá é o único lugar em que os celulares conseguem fazer e receber ligações.
A partir deste ponto, o mundo se abre em possibilidades e começamos a entender do que se trata A Short Hike.
Apesar de ser um pássaro, Claire não possui habilidades suficientes para chegar ao topo da montanha, então precisaremos coletar itens que façam com que nossa capacidade de voo melhore: as Golden Plume. Cada pluma faz com que a personagem consiga tomar mais um impulso quando já estando planando, fazendo com que possamos subir em plataformas mais altas. As plumas funcionam como a stamina do jogo, ajudando a escalar paredes e voar por mais tempo em lugares com o clima agressivo.
A progressão de habilidade através das plumas pode soar um tanto metódico, mas é exatamente o oposto disso. Conseguir as Golden Plume é uma tarefa leve, completamente atrelada à exploração. E é aqui que o game mostra seu lado mais inspirado.
Claramente referenciando um DNA Nintendista, o universo de A Short Hike abraça o fã da Big N com braços deveras calorosos. A começar pelos personagens que habitam Hawk Peak: todos são simpáticos animais, vivendo suas rotinas em mais um dia na carismática ilha.
Mesmo tendo em mente seu objetivo principal, que é o de chegar ao topo da ilha, será impossível não desviar de sua jornada enquanto estiver, inevitavelmente, explorando a região. Você acabará envolvido pelas simples e doces histórias dos NPCs, desde o menino-pássaro que inventou um novo esporte de verão, até o amargurado pintor, que questiona suas habilidades artísticas.
Logo você verá que o game o faz mergulhar em uma experiência emocional, com uma narrativa construída por meio de seu mundo, com personagens que merecem ser desbravados e onde tudo o que você fizer por eles será recompensado – às vezes com uma Golden Plume, que te ajuda diretamente na trama, ou mesmo com um simples “obrigado”, que, dentro do contexto do game e do mundo em que vivemos, faz muito sentido.
Com o perdão do clichê… menos é mais
Se tratando de um game de mundo aberto e exploração, A Short Hike é um jogo demasiadamente curto – o que, neste caso, não soa nada problemático.
Você pode escolher progredir suas habilidades sem se preocupar com os eventos que te cercam e tentar subir a montanha o mais rápido possível – apesar do senso de urgência não ser latente. Mas a exploração é um fator convincente, que empurra o jogador a querer descobrir, sem que pareça uma tarefa massante. Seja como for, dificilmente este será um game que te tomará muito tempo, mesmo que você se dedique aos mini-games presentes (sim, ele possui pescaria!).
A simplicidade é um fator constante em todo o jogo. Os diálogos são simples – apesar de super divertidos e precisos. Sejam os personagens, os cenários ou tudo mais que forma o game, nada extrapola o nicho e, cá entre nós, isto é louvável. Em muitos momentos vemos claras inspirações tiradas de Animal Crossing, Zelda, Celeste e outros títulos brilhantes desta geração.
A cereja do bolo fica por conta das músicas. O game envolve o jogador com canções suaves, em uma trilha sonora extremamente bem realizada pelo canadense Mark Sparling (outrora compositor de Shantae and the Seven Sirens e Orange Island). Inclusive, a trilha, que mistura um instrumental ambiental com neofolk, está disponível nos perfis de Sparling no Spotify e apps de música em geral. É recomendadíssima.
Vale a pena?
A Short Hike é uma aventura leve, em um mundo convidativo e recheado de minúcias, com momentos de realização fantástica. Planar pelos ares na pele de Claire evocará sensações já sentidas e conhecer os animais e as histórias de Hawk Peak pode ser uma experiência emocionante. E o final, sem spoilers, pode ser um soco forte para os desavisados. Principalmente no período complicado em que o mundo está mergulhado.
Recém-chegado no Nintendo Switch, o título parece ter sido feito para ele, mas está disponível também na Steam e na Epic Store.
Singelo, com gráficos muito bonitos e a capacidade de recompensar o jogador com diálogos e elementos de gameplay, A Short Hike é uma experiência imperdível. Até o momento, este é um dos melhores jogos de 2020 no Nintendo Switch.