Sete anos depois do último magnum opus da Rocksteady, o novo jogo da Warner Bros Games sofre penosamente para sair da sombra da franquia Arkham. Apesar de Gotham Knights aparecer como uma nova e refrescante proposta que busca tornar a Batfamília o centro das atenções nessa adaptação, o fantasma do morcego parece não deixar o jogo respirar, principalmente pelas inúmeras comparações inevitáveis que o jogo receberia.
Obviamente, a recepção morna e subitamente negativa não é causada pelos jogos anteriores da Rocksteady, mas sim pela falta de polimento, originalidade e decisões ruins de design que empesteiam Gotham Knights. Problemas que carregam os resquícios de um desenvolvimento conturbado e inúmeros adiamentos.
Mesmo com todos esses problemas, enterrado lá no fundo, existe um jogo divertido. A adição de um modo cooperativo online para enriquecer a experiência no mundo aberto é um dos principais pilares que sustentam o que há de melhor no jogo. Para quem jogou solo – como eu -, o sabor é mais agridoce.
O que aconteceu? Quais são esses problemas? Há esperança que esses problemas sejam consertados? São várias perguntas e críticas que devem ser feitas, principalmente se o jogo custa R$ 300 no varejo. Não há como responder tudo, mas tenho alguns pensamentos à respeito.
Os cavaleiros estagiários de Gotham
Falando um pouco sobre a história e dos personagens, afirmo que esse é um dos pontos mais altos de Gotham Knights. Após a morte de Batman, seus prodígios ficam encarregados de proteger a cidade contra ameaças criminosas de seus antigos vilões. Vários deles veem na morte do morcego uma oportunidade de crescer seu império e dessa forma o jogo se desdobra para contar as principais suas histórias.
A principal delas envolve a organização secreta da Corte das Corujas, grupo de vilões que antes nunca haviam sido explorados em algum dos jogos do Batman. A organização estaria envolvida no último caso do homem morcego e as várias amarras agora devem ser prendidas pelo restante da Batfamília.
Por Gotham Knights ser um jogo extenso em todas os frontes, a história se desenrola a passos de formiga. Não diria que é um problema de pacing, mas sim pela forma como o jogo é construído: ao contrário dos jogos Arkham, Gotham Knights não se passa em uma única noite. O game se desenrola em várias noites de patrulha em que o jogador soluciona crimes, faz sidequests envolvendo diversos vilões da franquia e realiza desafios.
Apesar da história ser interessante, o jeito que os personagens são escritos me incomodou um pouco. Certas conversas e interações entre Dick, Tim, Barbara e Jason são… esquisitas. Algumas beiram um nível de vergonha alheia. Dick e Jason, especialmente, contam com interações destoantes de seus personagens.
Os vilões seguem um padrão parecido. Harley Quinn, em especial, me decepcionou um pouco no que diz à sua representação. Em várias comics recentes e outras mídias (como sua série animada na HBO Max), promoveram um “arco de redenção” da vilã, principalmente depois de toda sua história com o Coringa. Vê-la representada como mais uma bad girl me incomodou singelamente, mas reconheço que é mais uma questão minha.
Problemas e problemas
A progressão do jogo foi algo que custou a fazer sentido pra mim. Por adotar um sistema de RPG, temos aqui toda aquela camada supérflua de equipamentos com cores diferentes, crafting usando uma penca de materiais aleatórios que servem como desculpa pro jogador abrir baús perdidos pelo mapa. Pouco impacto foi pensado para esse sistema que no final das contas pouco contribui para o jogo.
Outra coisa que me causou profundo desagrado foi o jeito que os desafios “Knighthood” são desenrolados. Para um jogo com uma cidade imensa e que a opção de viagem rápida não está disponível imediatamente, trancar um meio importantíssimo de travessia atrás de um extenso desafio não foi a melhor das opções.
Explico: cada personagem conta com um meio único de locomoção. Batgirl plana usando sua capa (idêntico ao que Batman fazia), Capuz Vermelho usa um recurso de “salto místico” onde o personagem realiza pulos em “plataformas” de energia, Asa Noturna conta um paraglider estilo Fortnite e Robin realiza um tipo de teletransporte. Nem todos são tão interessantes assim (especialmente do Capuz e Robin), mas são meios importantes de travessia. O gancho e a moto (que estão disponíveis para todos) podem ser lentos e chatos de se usar por muito tempo.
O layout da cidade e seu design também é algo que me causa certa estranheza. As ruas são vazias e estranhamente largas, causando uma sensação de abandono ainda maior. Pode-se argumentar que Gotham “é assim mesmo” pela pegada neo noir, mas nesse caso, é só vazio mesmo. Principalmente quando comparado com a Gotham de Arkham Knight, um jogo de sete anos atrás.
Além dos problemas
Ao ler esse texto, a impressão que passa é de Gotham Knights ser um completo desastre. Entretanto, há o que se aproveitar aqui. Toda a experiência com certeza é melhorada ao se jogar em co-op, caso que infelizmente não foi o meu.
O sistema de combate, apesar de simples, faz o trabalho e mantém um nível de engajamento ao longo das várias horas que o jogo te demanda para terminar a história e fazer os conteúdos adicionais.
A impressão que tenho é a de um jogo a ser consertado e lentamente transformado em algo bacana com o passar dos anos. Tenho minhas dúvidas se vai acontecer um No Man’s Sky aqui, mas há muito o que se repensar, tanto da parte técnica de performance como de design.
O principal problema é que todos esses defeitos se intensificam devido ao legado deixado pela franquia Arkham. O lastro deixado pela sombra do morcegão para jogos subsequentes no universo Batman construíram um muro altíssimo para os estúdios que se atrevam a escalá-lo.
Esse artigo foi escrito com base na versão de PC cedido gentilmente pela distribuidora.