Um dos memes mais recorrentes que eu via na comunidade de Resident Evil após o remake do segundo jogo, foi a galera comparando o quão mais assustador e aterrorizante o Nemesis seria em um futuro remake do 3 do que o Mr. X foi em RE 2. Em certos pontos, foi mesmo. Em outros… nem tanto. A aparição do temível Tyrant e sua caça incansável por Jill Valentine possui vários baixos e altos, mas o seu maior erro, pelo menos durante minha jogatina, foi a de não sentir que o monstro era, de fato, uma ameaça.
O foco de Resident Evil 3 mudou drasticamente em comparação a seu antecessor. Como os próprios desenvolvedores haviam dito, o game teria um enfoque mais na ação – ao contrário do clima carregado e tenso dos corredores da delegacia da RPD. Isso por si só não é, nem de longe, um problema. Vindo de alguém que jogou muito mais os jogos modernos de Resident Evil do que os clássicos, o balanço em Resident Evil 3 ficou um pouco mais comprometido por uma série de decisões que eu considero questionáveis por parte da Capcom em fazer o jogo parecer acelerado demais.
Tudo acontece muito rápido, em um ritmo frenético que tira um pouco da magia de se apreciar Raccoon City e o declínio da cidade tomada pela epidemia de zumbis. Por diversos momentos eu queria explorar mais, achar mais segredos, resolver quebra-cabeças e me sentir mais imerso nessa cidade incrivelmente renderizada com tantos detalhes. Apesar da qualidade técnica impecável que a Capcom vem mostrando com a RE Engine, nosso tempo em Raccoon é curto demais.
A história se passa, praticamente, ao mesmo tempo que RE 2. Raccoon está entrando em total colapso e os zumbis infestam as ruas, causando pânico e destruição na cidade. Planejando em fugir de Raccoon o mais rápido possível, nossa heroína Jill Valentine se encontra presa novamente em mais um inferno. Transtornada por pesadelos desde os incidentes na mansão Spencer, Jill é obrigada a fugir de seu apartamento quando uma criatura desconhecida invade seu apartamento e começa a persegui-la obstinadamente. Poucos momentos depois, encontra Brad Vickers, seu ex-companheiro na unidade S.T.A.R.S.
Brad rapidamente explica pra Jill que a criatura está caçando especificamente ex-membros dos S.T.A.R.S, na qual Jill e Brad participavam. Não demora muito tempo até que ele obriga a policial a deixá-lo para trás. Jill tenta fugir mas Nemesis a encontra novamente, mas é salva por outro personagem chave na história: Carlos Oliveira. O soldado é membro U.B.C.S (em tradução livre Serviço de Contramedidas de Risco Biológico da Umbrella) e foi enviado para resgatar sobreviventes durante o colapso de Raccoon City. Jill e Carlos vão para o metrô encontrar com outros sobreviventes, entre eles membros da U.B.C.S como Mikhail Victor e Nicholai Ginovaef.
A partir daí, a história se desenvolve de forma mais corrida, com leve introduções aos outros personagens e suas intenções. Senti que a apresentação sofreu com o ritmo do jogo, embora a trama tenha conseguido desenvolver Jill e Carlos como ótimos personagens. A policial continua mais badass do que nunca, além das partes jogáveis com o Carlos que foram uma boa adição e adicionaram variedade na campanha.
O gameplay e a jogabilidade são, em suma, os mesmos do que vimos em RE 2. A mira sobre os ombros, os zumbis, arsenal e o feel estão todos ali, impecáveis e fazendo parte do acervo de qualidade técnica que a Capcom se mostrou capaz de entregar. Algumas novidades foram implementadas, como por exemplo a esquiva que Jill é capaz de executar para desviar do agarrão das criaturas e um soco horizontal que Carlos pode usar tanto como maneira ofensiva e defensiva, também com a função de afastar os comedores de carne.
No caso da Jill, uma esquiva bem executada no tempo certo causa um slow motion, em que ao mirar a personagem ‘trava’ o alvo na cabeça do zumbi. Falando dessa forma, sinto que isso era para soar como uma mecânica intuitiva, né? Infelizmente, fiquei extremamente frustrado com a ineficiência desse movimento. “Git gud” à parte, a janela de tempo para se executar a esquiva de forma perfeita é muito estreita, dando vazão para agarrões desnecessários e uma extensa lista de vezes em que fui pego no MEIO da animação, quando Jill estava consideravelmente longe do zumbi que a atacou. O jogo simplesmente “cancela” o movimento que você fez e dá início a animação da criatura te causando dano.
Essa frustração também aconteceu repetidas vezes durante os encontros com o Nemesis. O Tyrant é capaz de vários movimentos acrobáticos, inclusive ao utilizar os tentáculos para te arrastar para perto dele. Uma vez perto, Nemesis é capaz de executar vários socos em sequência, dando um dano absurdo caso você esteja perto. A esquiva se mostrou inútil repetidas vezes por conta de seus ataques incessantes – o que de fato seria desafiador se não beirasse a desonestidade.
Ainda sobre o Nemesis, como mencionei no começo da análise, não senti que o monstro se demonstrou como uma real ameaça, e muito disso se deve a um único motivo: todas suas aparições são scriptadas. Todo momento X ou Y durante a história, Nemesis dá as caras. Isso quebra a ilusão que a criatura é um verdadeiro “stalker“, dando aquela impressão que você pode ser pego a qualquer momento. Ao contrário do Mr. X (que também aparece em momentos chave da história em RE 2, mas de forma bem mais livre) em que apenas seus passos são o bastante para deixar qualquer jogador com os cabelos em pé, ao rejogar RE 3 você sabe exatamente o que esperar.
A estrutura linear de RE 3, nesse ponto, causou mais mal do que bem. Eu não esperava um immersive sim, mundo aberto ou qualquer outro jogo do gênero, mas sim um pouco mais de liberdade que fosse o suficiente para o Nemesis se mostrar como algo a ser temido, e não apenas mais uma batalha contra chefe.
Mesmo com seus problemas recorrentes, Resident Evil 3 ainda mantém o nível de qualidade técnica e mostra como a Capcom pode contar histórias incríveis e produzir jogos com padrões acima do esperado. Infelizmente, um jogo tão querido como o original RE 3, essa era uma chance de ouro que não foi completamente aproveitada pela empresa.
Ainda existe um bom jogo aqui, mesmo que não seja o que eu esperava. Para o futuro, eu espero que mais oportunidades como essa apareçam e que algo verdadeiramente inesquecível seja criado.