Análise: Outlast 2 é aterrorizador e assustadoramente frustrante

A demanda por jogos de terror sofreu uma grande reformulada nos últimos anos. Seja por Silent Hills ter sido cancelado ou Resident Evil ter tomado um rumo completamente diferente com o sétimo jogo da franquia, hoje eu sinto que os entusiastas do gênero estão cada vez mais interessados em explorar temas mais diversos do que o monótono clichê que há anos vem sendo padrão nesse gênero.

Quando o primeiro Outlast lançou, lá em 2014, tivemos os mesmos ingredientes que compuseram a fórmula: sanatório praticamente abandonado, pouca luz, inimigos te perseguindo, jumpscares etc. Parecia mais um jogo fadado à mesmice – até que começasse a te mostrar uma nova perspectiva da imundice humana. Foi um jogo cativante, tanto pelo gore excessivo quanto pelo enredo que te prendia minuto por minuto.

Seguindo essa premissa, a Red Barrels – produtora de Outlast – quis ir além. Expandir o cenário para uma área rural, expandir seus inimigos, expandir os quebra-cabeças: entretanto, o que eu senti não foi expandir. Foi tentar consertar. E até onde eu sei, não se tenta consertar o que não está quebrado. Embora trouxesse pontos memoráveis na franquia, Outlast 2 segue um caminho reverso do que seu antecessor tomou.

Dentro do barril

Calçando os sapatos do jornalista independente Blake Langermann em parceria com sua esposa também jornalista, Lynn, os dois embarcam numa jornada rumo à terras desconhecidas do estado de Arizona, EUA, para investigar o caso de uma mulher desaparecida sob “circunstâncias misteriosas”. A mulher, que não possui nenhum tipo de identificação, estava grávida e era conhecida apenas pelo nome genérico de Jane Doe.

Abordando a área de helicóptero, um rápido resumo do caso é repassado ao jogador antes dos desastres começarem a acontecer. No meio do voo, uma forte luz branca emana do céu, cegando o piloto e causando um terrível acidente – embora Blake e Lynn tenham saído com vida, o mesmo não se pode dizer do piloto que foi encontrado num estado semelhante a crucificação, perto do lugar do acidente. Indicando, novamente, que algo de muito errado estava acontecendo naquela área.

Blake, na companhia de sua câmera, parte para um pesadelo sem fim com apenas um único objetivo: resgatar sua esposa e sair dali com vida. Como era de se esperar, uma premissa que é simples, se torna num emaranhado de informações, descobertas, segredos, conspirações e tudo mais. No primeiro Outlast, a ligação com o sobrenatural tinha um pé dentro da ciência — o projeto Wallrider buscava exaurir todo o horror e pavor humano como uma espécie de combustível para uma entidade sobrenatural empoderada com nanomáquinas.

Em Outlast 2, a temática religiosa se faz presente o tempo inteiro. As “facções” são dividas entre os seguidores do culto, liderado pelo padre extremista conhecido como Papa Knoth, e os Hericts, dissidentes desse culto e de Papa Knoth — que agora estão sob o comando de um homem conhecido apenas como “Val”. Ambos são aterrorizantes e seguem propósitos distintos: o culto de Knoth prega que ele deve exterminar todas as crianças nascidas naquelas redondezas afim de evitar a vinda de um suposto Anticristo. Val, por sua vez, sequestra a esposa de Blake para dar luz a essa “criança”.

O buraco é muito mais em baixo, porém irei me ater aqui para evitar spoilers. Embora seja um conceito interessantíssimo — mostrar o radicalismo cristão por meio de ações duvidosas — senti que o jogo perdeu em muito o seu brilho que deixava os acontecimentos mais críveis. [highlight]Há documentos de texto que necessitam ser lidos para um entendimento mais amplo, principalmente do final[/highlight]. Caso você não tenha jogado o primeiro jogo (ou não tenha se atentado ao que rola lá) muitos acontecimentos permanecerão soltos.

Blake também enfrenta um embate interno — como se o pesadelo de ser perseguido por cultos sanguinários não fosse o suficiente. Há vários flashbacks sobre seus momentos na escola e sua amiga de infância, Jessica, que foi encontrada enforcada. Nesses segmentos, há constantes perseguições de uma criatura que se comporta como uma espécie de Nemesis de Blake, perseguindo-o e matando o jogador com apenas um tapa.

Ao concluir o jogo, senti que faltou algo. Uma explicação, talvez. Um final mais conclusivo, algo que não se relacionasse e dependesse tanto do outro jogo para algumas coisas fazerem sentido. Senti que alguma coisa faltava, uma conclusão mais apropriada. Infelizmente, veremos isso em alguma DLC — algo que aconteceu com o primeiro Outlast.

Corrida sem fim

As mecânicas são básicas: você corre, se esconde e não luta. Com o intuito de deixar o jogador indefeso, a atmosfera e todos os elementos que constroem esse sentimento de terror passa a ser uma ameaça — além de dar aquele toque requintado do player se tornar a vítima indefesa correndo do assassino psicótico. O primeiro Outlast foi assim, a fórmula aqui apenas se repetiu, adicionando alguns recursos a mais.

O design de cada área foi planejado com rotas de fuga que, em sua maioria são lineares com poucos pontos de retorno caso você atinga uma parede no final do corredor ou não se atentou a uma porta ou passagem para a próxima área. Até porque fica um pouco difícil pensar direito quando se está correndo de uma horda de radicais cristãos querendo te crucificar. Então, além de encontrar inúmeros becos sem saída (resultando em sua morte quase instantânea), é preciso lidar com a frustração recorrente de não encontrar seu objetivo – mais do que no primeiro jogo.

Em particular, ressalto um trecho que me fez repensar minha existência com Outlast 2: existe uma vila abandonada onde o único ponto de saída é pulando um portão de madeira trancado. Uma espécie de carrocinha está há alguns metros do portão, levando a raciocinar que é necessário empurrar o carrinho até portão e pulá-lo. É um objetivo relativamente simples, caso não houvesse um inimigo com uma visão biônica que consegue te ver há quilômetros de distância.

Realizar essa tarefa foi um tiro no pé, me fazendo perder as contas de quantas vezes eu morria. É um verdadeiro teste de paciência, onde o medo e a tensão dão lugar à raiva e frustração. A iminência da morte deixa de ser um desafio e passa a ser realidade. “Vou morrer mesmo, qual a diferença? Só vou tentar de novo.” [highlight]E é péssimo quando o gameplay começa a se resumir nisso[/highlight].

Existe uma linha tênue entre um level design claustrofóbico, que te deixa apreensivo, desesperado por uma saída e um completamente frustrante. Muitas vezes senti meu progresso empacar, comprometendo a fluidez da minha experiência. Para um jogo com grande enfoque narrativo (além da sobrevivência), fiquei bem decepcionado. Porém, quando se consegue fluir, somos recompensados com ótimas sequências — me fazendo desejar que boa parte do jogo fosse assim.

E que Deus te abençoe

É possível sentir a ambição de Outlast 2 logo nos primeiros minutos. Gráficos incríveis, dublagem sensacional e um setting que te faz sentir arrepios do começo ao fim. Carregando um legado recém-criado com o primeiro Outlast, a Red Barrels tentou de todas as formas inovar ainda mais, seja pelos cenários fomentados em gore e violência absurda ou pelos temas religiosos considerados tabus na sociedade ocidental.

Embora consiga ter momentos brilhantes, Outlast 2 deixa a desejar com seu level design frustrante e pressão incessante que te anestesia da tensão e o medo. Por fim, sua história incongruente te faz desejar que as coisas tenham sido um pouco melhor exploradas e explicadas. Talvez eu esteja querendo demais nesse ponto, porém não fui o único a sentir isso. Discutindo com meus amigos, Outlast 2 tentou demais ser alguma coisa que nem o próprio jogo sabe o que é.

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Essa análise foi escrita com base na versão de PlayStation 4 cedida gentilmente pela desenvolvedora.

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