É difícil brilhar após The Last of Us Part II

É comum em meio a um ano de muitas novidades deixar passar batido alguma obra da cultura pop. Por vezes aquele filme, que você se empolgou com o trailer, se perde em meio a uma turbulenta janela de lançamentos empolgantes, e por não ser a mais incrível das produções de sua época, ela acaba sendo levemente injustiçada. Ou mesmo esquecida.

O mesmo acontece com os videogames. Se você parar um minutinho e dar um google, não será muito difícil encontrar listas falando sobre títulos que passaram despercebidos. Aquele jogo super legal de navinha que você não jogou, um RPG irado que homenageia aquele cartucho que você teve na infância… sempre tem alguma coisa legal que a gente deixa escapar, muitas vezes prejudicadas por um momento repleto de outros títulos chamativos, que exigem muitas horas de dedicação e imersão.

Mas em 2020 a coisa mudou totalmente de figura.

É quase impossível que as pessoas deixem de falar de um jogo que tenha o mínimo destaque. Com a bagunça causada pelo isolamento social, devido a pandemia do COVID-19, os olhos estão mais do que voltados para o entretenimento —este que soa quase como um Chapolin Colorado respondendo aos lamentos de suas vítimas chorosas. Qualquer coisa que seja capaz de anuviar o constante estado de tédio e preocupação acaba sendo comentado demais — e até mesmo elogiado demais, em alguns casos, como se as pessoas tivessem criado um senso de gratidão tão gigantesco que não são mais capazes de discernir uma obra medíocre de uma com valor elogiável. O crítico emocionado me parece a grande tônica deste ano.

Vale frisar que passei as últimas semanas jogando Ghost of Tsushima antecipadamente mas isto aqui não é um review.

Em meio a adiamentos, cancelamentos (de pessoas, eventos e empresas), entre junho e julho tivemos fixado em nossas agendas as datas correspondentes a dois games de destaque: The Last of Us Part II e Ghost of Tsushima, precisamente nesta ordem. Ambos exclusivos do PlayStation 4. Ambos com grandes expectativas.

Mas se no primeiro caso temos um título corajoso, com uma narrativa elástica e personagens marcantes, no segundo a coisa se torna totalmente o oposto. E vir logo depois da jornada visceral do game da Naughty Dog não é tarefa para poucos. Não à toa, Ghost of Tsushima se encolhe em meio a gigantesca sombra de The Last of Us.

Vamos chamar isso de “Efeito The Last of Us”

Talvez, o game de samurais poderia se esconder em meio a uma grande nuvem de jogos se não vivêssemos um ano tão carente. Cyberpunk 2077 já teria vindo ao mundo, na antiga previsão de lançamento para abril, e emendaríamos um combo de Animal Crossing, Final Fantasy VII Remake, Cyberpunk, The Last of Us 2… seria difícil olhar com tanta atenção para Ghost of Tsushima enquanto estivéssemos com o gostinho destes títulos na boca. Ou talvez olhássemos com ainda mais rigor.

Enquanto muitas pessoas ainda estão vivendo a experiência de The Last of Us Part II, para quem já terminou ainda resta digerir. Potencial candidato ao Game of The Year, o título brilha sem muito esforço e cria um mito em torno de si tão poderoso que fica difícil imaginar concorrente a altura. E o Efeito The Last of Us se mostra mais intenso quando o próximo da fila é um game do leque de exclusivos do PS4. Não é como se os jogos fossem parecidos mas é inevitável, para a maioria dos jogadores brasileiros que não conseguem acompanhar o ritmo de lançamentos a R$250, que a dúvida paire: “Qual eu jogo primeiro?”, “Qual é melhor?”; Dentre outras dúvidas.

Mas veja bem, o jogo de samurais não é ruim pelo fato de The Last of Us Part II ser muito bom — ele tem seus próprios méritos na hora de ser chamado de sem graça ou engessado. É culpa dele mesmo. Um mundo aberto cheio de promessas acaba sendo um alvo fácil de questionamentos. E em meio a uma geração repleta de narrativas e cenários acertados, Ghost of Tsushima se aproxima mais dos conceitos genéricos e ultrapassados do que da ousadia. É bonito mas não genuíno.

Talvez o mundo tenha sido injusto com Tsushima, preparando uma verdadeira arapuca montada com todos os elementos de azar possíveis. Possivelmente ele seria lembrado com mais empolgação se estivesse mais escondido em meio a conferências, lançamentos, E3… poderia ter se tornando um daqueles jogos que poucos jogaram e seria lembrado pelos mestres da Wikipedia como “aquele jogo que ninguém jogou e que na época era muito bom” ou mesmo “um clássico cult”. O famoso jogo para agradar sommelier. Mas 2020 não deixará isso acontecer. É o ano do imediatismo para os sedentos por distração.

É azar atrás de azar.

No fim das contas, com todo o tédio da quarentena, só me resta agradecer por ter mais um jogo de videogame para passar o tempo. Que bom que eu gosto de samurais, do Japão feudal, de paisagens bonitas e também de jogos com modo foto.

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Acompanhe o Jogazera para mais conteúdos sobre Ghost of Tsushima. Em breve traremos um review completo no site.

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