Análise – Thirty Flights of Loving

Thirty Flights of Loving (TFOL) não é um lançamento recente, mas jogos independentes estão aí para serem revisitados.

Primeiramente, deve-se associar que a Blendo Games tem elaborado um universo cubista com uma série de jogos, sendo eles Gravity Bone (gratuito – PC/Mac), Thirty Flights of Loving (R$10,49 – PC/Mac) e um futuro lançamento chamado Quadrilateral Cowboy (R$?? – PC/Mac), que está previsto para este ano.

Estes jogos tem uma forma de narrativa diferente, e o que foi proposto em TFOL é passar uma história sem diálogos, sem menus na tela, de modo que o jogador intuitivamente seguisse uma história linear e entendesse o que acontece no universo em que está inserido.

Enquanto o jogo foi muito bem recebido pela critica, uma sensação não-tão-honesta ficou no ar, quando vi muitos relatos – e compartilhei da mesma experiência – de que o que os jogadores puderam ver estava um tanto discrepante do que a crítica alegava.

Confira abaixo uma análise completa deste estranho jogo, dedicado à um público muito, muito especifico (de verdade!).


Enredo & Gameplay

Thirty Flights Of Loving é uma aventura em primeira pessoa. O foco do jogo é em passar toda informação necessária por meio do cenário, sem diálogos, sem falas, ambientado pela trilha sonora e pela atenção do jogador.

O jogador entra em uma espécie de operação de tráfico de bebidas alcoólicas, participando ao lado de outros dois coadjuvantes que acompanham o personagem principal através de uma história linear.

Enquanto o protagonista não possui um nome, os coadjuvantes possuem seus nomes e um rápido flashback para mostrar suas características, um jeito esperto de mostrar algo sem uso de diálogo.

As limitações dão ao jogador muito pouca interação durante o jogo, podendo apenas se mover e pegar/ativar objetos necessários para o progresso da história.

A ideia de TFOL teria sido genial, e até mesmo muito ousada, se não fosse por um pequeno detalhe – o jogo possui cerca de 15 minutos de história.

Álcool é um elemento abundante na história.
Álcool é um elemento abundante na história.

O jogador começa sua aventura em um corredor, que apresenta os comandos de jogo, chegando então em uma sala cheia de bebidas.

Ao prosseguir com sua caminhada, o protagonista sem nome entra em uma sala onde é introduzido aos coadjuvantes Borges e Anita.

Apesar de ter acesso à armas e munição na sala, nem mesmo um único disparo será efetuado pelas mãos do jogador durante todos os 15 minutos de história.

Por outro lado, o jogador pode ver algumas características de seus aliados ao interagir com eles, ativando um rápido flashback que mostra algumas características dos personagens.

Borges e Anita, na verdade, são os dois personagens responsáveis pelo caminhar da história – pois o jogador não pode influenciar em nenhum resultado da narrativa, independente do caminho que tome.

Isso se deve à mecânica do jogo, de cortes súbitos na linha do tempo. Em um momento, o jogador encontra-se em uma sala, no outro, em um aeroporto, ou em um salão de um museu.

Cabe inteiramente ao jogador pegar as referências no cenário e montar o quebra-cabeças em sua mente. O problema disso tudo é que, com uma narrativa tão rápida, o jogador está sempre bombardeado de referências e detalhes, sem tempo para digerir o que está assistindo.

Anita é uma das responsáveis pelo caminhar da narrativa.
Anita é uma das responsáveis pelo caminhar da narrativa.

As situações são passadas por características sutis, em que o protagonista faz uso de álcool, come laranjas com Anita ou têm uma arma apontada para sua cabeça.

A história inteira do jogo poderia ser contada em 2 parágrafos aqui, mas o que é surpreendente mesmo são os diversos buracos que ficam em meio à narrativa.

O jogo deixa, no fim, muitos questionamentos – os quais o jogador nunca terá a resposta. A sensação deixa de ser um estilo de narrativa diferente e passa para um jogo que saiu incompleto, deixou falhas em sua história.

Ao final, o princípio de Bernoulli é explicado em uma sala, passando a lição de como ar de alta e baixa pressão funciona. Esta é, provavelmente, a melhor sala do jogo, e infelizmente, que tem muito pouca relação com o enredo principal.

Quesitos técnicos

Gráficos

Os cenários são peça chave do jogo, dando todas as referências.
Os cenários são peça chave do jogo, dando todas as referências.

Desenvolvido em uma modificação da plataforma id Tech 2 – utilizada em Quake 2 – o jogador controla, em primeira pessoa, um personagem sem nome em um mundo cubista.

Não há uma grande refinação do visual, e a ausência de mãos e braços do personagem pode irritar alguns jogadores, mas não é algo tão relevante no conceito completo do jogo.

Os cenários são simples, mas ao mesmo tempo, recheados de detalhes que são o fundamento principal para entender o que acontece em cada situação do jogo.

A ambientação dos cenários é impecável, TFOL apresenta um sentimento em cada cenário, desde a agitação do cotidiano de um aeroporto até a diversão de uma festa de casamento.

Áudio

O ponto mais forte do jogo, sem sombra de dúvidas. Chris Remo, compositor e membro da Idle Thumbs, conseguiu colocar todo o clima de cada cenário na trilha sonora.

O som encaixa como uma luva em cada situação, seja em um momento de ação, ou no encerramento da história, a presença da trilha sonora é indispensável para maximizar os 15 minutos de experiência que o jogo traz.

O posicionamento do áudio ficou muito bem colocado, onde a posição do jogador interfere, com grande evidência, no lado e na distância em que sua audição irá captar o som.

Já os efeitos sonoros são básicos, nada muito fora do normal – em alguns momentos, sons como o de comer uma laranja são até mesmo desagradáveis.

Outros quesitos

Versão do Diretor

A "dança vertical alcoolica" é explicada na versão do diretor como um Bug-Divertido.
A “dança vertical alcoólica” é explicada na versão do diretor como um Bug-Divertido.

Disponível no menu do jogo, é possível jogar a versão com comentários do diretor.

Por ser uma narrativa de 15 minutos, é aconselhável que jogadores mais curiosos joguem a versão logo após a primeira finalização do jogo.

Apesar de não explicar nada sobre a história principal de TFOL, a versão do diretor apresenta e explica alguns detalhes sutis que podem auxiliar na conceitualização do enredo final.

Gravity Bone

Disponível gratuitamente na internet, o predecessor de TFOL também encontra-se disponível no menu principal do jogo.

Conta com o mesmo personagem de Thirty Flights of Loving, porém tem uma narrativa diferente de seu sucessor.

Não preenche nenhuma  resposta necessária pra narrativa de TFOL, mas é aconselhável para quem deseja ver o universo cubista que a Blendo Games desenvolveu como um todo.

Conclusão

Alguns dirão que o charme de Thirty Flights of Loving está na ambiguidade da história, ou nos cortes de linha do tempo súbitos.

Há interpretações que justificam a impotência do jogador com seus atos, de modo que ele não influencie em nada na narrativa.

Porém, 15 minutos por R$10,49 é um pouco mais complicado do que parece. Apesar de tentar prolongar a experiência com versão de diretor e com o predecessor, a Blendo Games ainda deixa bastante a desejar ao tentar inserir um novo modo de jogar aventuras em primeira pessoa.

Talvez se TFOL fosse elaborado em outra ocasião, com mais tempo e mais atenção a ser dada, principalmente em preencher os buracos de sua narrativa, traria resultados melhores.

O grande mistério mesmo é: Thirty Flights of Loving recebeu notas tão altas na crítica por ser um jogo excepcionalmente bom, ou por todos desejarem fazer parte de um nicho de jogo extremamente específico?

A experiência é única, mas poderia ser muito, muito melhor aproveitada com pequenas adições e um controle melhor de cortes na linha do tempo.

Há uma diferença entre experiências curtas e experiências incompletas, e infelizmente, Thirty Flights of Loving pende para uma experiência incompleta.

Thirty Flights of Loving Review