Análise – The Witcher 3: Wild Hunt

Grandioso não só em tamanho, The Witcher 3: Wild Hunt traz uma experiência tão pessoal que não caberia em uma análise.

Jogos com orçamentos milionários, blockbusters com milhões de dólares investidos em propagandas e números para demonstrar o quanto você precisa daquele jogo é algo extramente comum hoje em dia, não preciso ficar citando exemplos – conhecemos bem a regra do mercado de games atualmente. Velhas indagações me vem à mente, perguntando e procurando motivos se devo ou não gastar 200 reais em um jogo – produto que, querendo ou não, é luxo. E bem, eu não sou rico. Tenho que saber exatamente com o que e como vou gastar parte do meu dinheiro destinado a esse (quase) vício na minha vida que carrego desde criança, também conhecido como videogame.

Comprei os dois primeiros Witchers numa daquelas promoções alopradas do Steam (à lá 85% de desconto) depois de procurar saber um pouco sobre, entender acerca do universo criado pelo polonês Andrzej Sapkowsk e sua série de livros sobre o bruxo (adaptação mais próxima de “Witcher” para o português) Geralt. Apesar de ter insistido bastante no primeiro jogo da série, seu fator gameplay não conseguiu me prender – e antes que eu desistisse, por que não tentar o 2? Com um sistema de combate completamente refinado e replanejado, o famoso “Game of the Year” de 2011 teria sido ele caso Skyrim não existisse. Com um enredo independente do primeiro jogo, The Witcher 2: Assassin of Kings foi um dos melhores títulos que eu joguei no computador.

E claro, como não ficar ansioso pelo terceiro jogo? Sinto que, em todos esses anos jogando videogame, nunca senti meu dinheiro tão bem gasto e investindo em alguma coisa antes. E não é só por causa da edição simples que parece de colecionador (com trilha sonora, adesivos, mapas, manuais, encartes e uma carta de agradecimento), mas porque The Witcher 3: Wild Hunt consegue ostentar e fazer jus a toda a responsabilidade que teve em seu marketing desde quando foi anunciado.

Sobre lobos e homens

O mundo de The Witcher se passa nos anos 1200, quando fortes conflitos entre os vários reinos do norte se desencadeiam e uma guerra sangrenta passa assolar qualquer cidade ou vilarejo que se atrevesse a ficar no caminho dos reinos de Nilfgaard e Redania. Ambientando em um universo com várias criaturas de cunho mitológico polonês, encontramos todos os tipos de monstros que habitam estórias e mundos fantasias dos livros e cinemas: espectros, draconídeos, harpias, guardiões elementais e mais uma grande variada gama que pode ser encontrada e estudada na parte do Bestiário, no menu do jogo.

Devido à essas tensões políticas (dentre outros fatores), discriminações raciais também predominaram boa parte das grandes cidades que encontramos no jogo, não sendo lugar para elfos, bruxas ou qualquer raça que não seja a humana. E claro, nessa categoria também entram os witchers. Sendo uma espécie de “super humano”, witchers eram crianças normais que passaram por uma série de desafios – “trials” – para sofrer uma rara mutação e transformar seus sentidos, percepções, atenção, força e intelecto para algo muito distante do visto em uma pessoa normal. Entretanto, isso tem um custo: apenas 3 em cada 10 crianças que passaram nesses desafios conseguem sobreviver a mutação e se tornarem witchers.

Geralt de Rivia foi uma delas. Caçador de monstros experiente, detentor de uma beleza inconfundível – o Lobo Branco, como também é conhecido, possui adoração imensa e carinho enorme por sua filha de criação e descendente do trono de Nilfgaard: Cirilla Fiona Elen Riannon – ou Ciri, para os íntimos. Ciri não é qualquer criança; dotada de um poder misterioso advindo de um antigo sangue élfico correndo em suas veias, sempre foi aconselhada a tomar cuidado ao se distanciar de Kaer Morhen (a fortaleza dos witchers). E o poder de Ciri vai muito além daquilo que imagina, por conta destes também foi conhecida como “A Moça do Tempo e Espaço“, sendo literalmente o que isso quer dizer. Ciri é capaz de viajar entre mundos, em diversos tempos e épocas.

Tanto poder não iria sair barato. Uma legião de elfos poderosos e antigos, conhecidos como Caçada Selvagem, não deixariam Ciri em paz um bom tempo. Por esse motivo, a moça vive uma vida de fugas e tensões, com medo de Eredin, o líder da Caçada, aparecer a qualquer momento e fazer sabe-se lá o que com Ciri em função de usar seus poderes a bel-prazer. Geralt passa boa parte do game atrás de Ciri e busca saber de seu paradeiro, enquanto passa pelos mais variados reinos e lugares que tomam espaço a guerra. White Orchard, Velen, Novigrad e Skellige serão os principais caminhos do Lobo Branco em busca de sua protegé.

The Witcher 3: Wild Hunt

Em toda esquina uma história

“Então é só procurar ela e lutar contra a Caçada Selvagem?” Teoricamente sim. Enquanto você faz um contrato para procurar uma pérola preta raríssima para um pescador e ele pedir sua amada em casamento, ou resolve uma maldição de um lobisomem num complicado casos de família onde uma irmã mata a outra para ficar com o rapaz amaldiçoado, por amor. Ou tenta resolver seus próprios conflitos amorosos. Yennefer de Vengerberg não vai aguentar outra desculpa de quando você “perdeu a memória” e acabou se entrelaçando com Triss Merigold. Como dizem o velho ditado do “siga seu coração”.

São milhares de histórias. Emocionantes, enfurecedoras, decepcionantes e conflituosas. São pessoas vivendo suas vidas, se relacionando e vivendo os atritos de uma convivência humana em tempos de guerra. Escolhas nos diálogos determinam o seu futuro e o futuro do seu jogo, podendo se traçar vários caminhos e fazer sua própria história. E tudo isso com a maior liberdade possível, sem nenhum tipo de demarcação de “sua quest começa aqui e acaba ali”, “mate X inimigos e entregue a quest” ou qualquer outra missão paralela que te faz querer dormir em cima do controle. Faça o que você quiser, quando quiser e como quiser. Caso queira só apreciar as paisagens de uma das outras milhares de vistas que o jogo oferece, pode também.

Em minha jornada de 80 horas eu esquecia que existia algum padrão para se jogar videogame. Aquela sensação de pegar no controle e automaticamente repetir tudo aquilo que você já viu em um jogo: ”pegar missão tal; fazer missão tal; entregar missão tal; pegar sua recompensa” – coisa que normalmente acontece em um RPG. Em The Witcher 3 isso parece tão vivo, tão significante que é impossível ficar com raiva da velha que te faz procurar a frigideira dela dentro da casa que antes ela não conseguia entrar.

Entretanto dessas mil maravilhas, é importante também não esquecer que é um jogo. E nenhum jogo é perfeito: embora quedas de quadro por ventura se tornam frequentes em algumas partes do mapa e bugs bizarros possam acontecer de tempos em tempos, vemos mais uma vez que a experiência do jogador aqui se torna prioridade, e não o seu dinheiro. E é isso que eu quero ver: mais histórias, mais contos, mais experiências que possam valer muito mais do que os R$ 200 reais que eu paguei num CD e uns panfletos.

The Witcher 3: Wild Hunt conseguiu cumprir esse quesito com excelência.